“Falo-vos da
Montanha – poemas” de António Cabral
edição de autor
17 de Outubro de
1958
APOSTO AO “HOMEM MENSURA”
As palavras húmidas
Do suor nascido
E corrido das
Paredes do cérebro;
As palavras idas
No corpo do vento,
Vindas no comboio
Noturno dum sonho;
As palavras dadas
Na respiração
Dos poros, nas mãos
Marcadas de terra;
Essas é que dão
Lugar à ternura
E gritam o homem
Dos pés à cabeça.
Ao reler os magníficos poemas de A. C., ocorrem-me as conhecidas palavras de
Walt Whitman: “Aquele que tocar este livro toca um homem”. Efectivamente, “Falo-vos
da Montanha” – o último livro de poemas de A. C. – significa algo mais que um
belo livro de poesia. Prescinde, o autor, daquilo que Hernâni Cidade chamou
“poesia-jogo” e do verbalismo exagerado de alguns poetas de vulto, entre os
quais poderiamos citar F. Pessoa, para nos introduzir no reino da poesia
autêntica. Não receia as palavras nuas e sangrentas, que dizem “a verdade das
suas horas de homem”. Mais ainda: Ele procura essas “palavras talhadas à feição
dos ossos”, porque aquele poeta que o habita,
…Tem os pensamentos/Amontoados/À espera da palavra/E,/Luta por ela esfarrapando
o tempo.
[CHAVES, Dinis –
António Cabral o humaníssimo poeta de “Falo-vos da Montanha”. A Voz de
Chaves. Chaves (01-01-1959)]
Poeta da paisagem,
a que se liga pelos laços da sua paisagem interior, religiosamente calmo
perante os sucessivos partos da natureza (as espáduas da montanha por onde
escorrem tranças de lua; o bailar das sombras na festa do pôr do sol…), António
Cabral é, no entanto, um poeta do homem, dessa gente humilde com palavras
torcidas em raivas humaníssimas… (…) A crença nas palavras, como quando as
canta se prova, grava no poema uma claridade fina, às vezes quente, outras
suavemente frágil: Palavras que sejam / O ritmo do sangue / E tenham a altura /
Toda duma alma.
[BRITO, Casimiro de
– Título do artigo. Cadernos do meio-dia: antologia de poesia, crítica e ensaio.
Faro. N.º 4 (fevereiro, 1959)]
Escreve algures
Dâmaso Alonso que a poesia é um nexo entre dois mistérios: o do poeta e o do
leitor… Esta afirmação tem inteira aplicação ao caso de António Cabral.
O leitor não pode superficialmente permanecer numa atitude passiva perante a
sua poética. É que ela prende-o, absorve-o, e arrasta-o. Impregnada dum poder
mágico – que outras não se ufanam de desfrutar – esta poesia possui algo que a
especifica, que lhe confere uma tonalidade própria.
Além disso, deste livro que é o segundo (sic) do Autor, desprende-se uma densidade
que não se afigura vulgar. E parece-me que é essa densidade – com raízes em
Torga e Teixeira de Pascoais – mas possuidora simultaneamente dum cunho pessoal
inegável, que poderá classificar-se como a principal característica do jovem
poeta.
[GERALDES, J.
Almeida – “Falo-vos da montanha” por António Cabral. Novidades. Lisboa
(08-11-1959)]
Jean Cossou afirmou:
“Il n’est de problème que de l’homme, et il ne peut être de poesie que de
l’homme”.
A poesia é, pois, o homem com as suas frustrações, os seus problemas e a sua
posição perante a vida e perante Deus.
“Falo-vos da
Montanha” é a síntese desse fenómeno exclusivamente humano e profusamente
ilustrado por poemas recheados de pureza e propriedade de estilo, de apurado
sentido rítmico, de todas as características, enfim, que assinalam ao autor uma
personalidade de autêntico poeta.
[MIRANDA, Alberto –
Falo-vos da montanha (poemas de António Cabral. Amigos de Bragança. Bragança (1967)]
Disponível na
Traga-Mundos – livros e vinhos, coisas e loisas do Douro em Vila Real... |
Traga-Mundos – lhibros i binos, cousas i lhoisas de l Douro an Bila Rial...
[também os seguintes
títulos do autor: “Falo-vos da Montanha”, “Entre o Azul e a Circunstância”, “Ouve-se
Um Rumor” Poemas de António Cabral + “Entre Quem É” - «Este caderno é um anexo de
“Ouve-se Um Rumor” e não pode ser vendido separadamente.», “Antologia dos
Poemas Durienses”, “Bodas Selvagens”, “O Rio Que Perdeu As Margens”, “A
Tentação de Santo Antão”; “Viajar Com... António Cabral” de A.M. Pires Cabral]