Vila Real –
cidade dos três santos populares?
Vindo de
Lourenço Marques, Moçambique, África, realizei os estudos secundários na cidade
de Vila Real, onde cresci com um olhar forasteiro e encantado pelas suas
diversas tradições – algumas peculiares e únicas!
Na magnífica
feira de Santo António, descobri os “pretinhos de santo antónio”, ou pretinhos
da sorte… se fossem roubados! E a existência da capelinha de um Santo António
dos Esquecidos…
No Bairro de
Santa Margarida, vulgo Rua dos Ferreiros, festejava-se a noite de São João com
o saltar de fogueiras, num ambiente mágico e como que transgressor… [o bairro
era um recanto estigmatizado da cidade: quando me matriculei na Escola
Preparatória Diogo Cão, vindo de uma aldeia, fui colocado na “turma dos da
aldeia e do bairro dos ferreiros”, em contraponto com a “turma dos da cidade”!]
Na Feira de
São Pedro, vulgo feira dos pucarinhos, um mar telúrico de peças de olaria negra
de Bisalhães, aprendi a jogar ao panelo e a admirar a diversidade das artes de
homens com mãos marcadas pelo barro e pelas rodas de oleiro manuais.
A minha vida
de traga_mundos seguiu diversos destinos e afazeres, do Baixo Alentejo a
Norddeutchland, passando pela Guiné-Bissau. Regressei a esta cidade, anos
depois, e constato uma mudança na vivência actual dos três santos populares –
inspirado num conceito de «mercantilização e aporia da “cultura popular”» da
antropóloga Paula Godinho.
O Santo
António – apesar da louvável manutenção da típica feira do gado… que passará
despercebida aos condutores da cidade! –, resume-se a uma espécie de feira
popular, de carrosséis eléctricos e carrinhos de choque, farturas e afins… –
com uma localização absolutamente inadequada! E o desfilar de marchas similares
às dos bairros alfacinhas da capital!
O São João
subiu do bairro para se espalhar pelas ruas do centro histórico – uma acção que
teve o seu início no Cabo de Bila por iniciativa dos seus comerciantes – e é
uma noite de comes e bebes, tipo portuense, e… devidamente sentados! –
curiosamente, é a única noite do ano em que a população de uma cidade capital
de distrito vive as suas ruas!
O São Pedro
é essencialmente uma feira de cuecas e peúgas, em saldo à meia ou à dúzia, onde
os vila-realenses anualmente se abastecem! A presença da olaria negra de
Bisalhães é meramente simbólica – digamos que, evocativa…
Vila Real –
cidade dos três santos populares? – festa por festa, faltará importar as festas
juninas brasileiras, para se candidatar à UCCLA – União das Cidades Capitais de
Língua Portuguesa, pois então!
António
Alberto Alves
a olhar a
Feira de São Pedro à porta da livraria Traga-Mundos, em Vila Real
28 de Junho
de 2017
revista
“Explora”, setembro 2017, página 49
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