“Memórias e
Divagações” de João de Deus Rodrigues
prefácio de A.M.
Pires Cabral
ilustrações de Luís
Manuel Pereira
O meu
gato e o meu cão
Lá em
casa todos tínhamos nome,
Excepto o gato.
Esse era o gato, ou, quanto muito, o miau.
E como bom felino que era,
Não tinha cara de mau, não,
Embora se julgasse o patrão...
Excepto o gato.
Esse era o gato, ou, quanto muito, o miau.
E como bom felino que era,
Não tinha cara de mau, não,
Embora se julgasse o patrão...
A
ronronar, junto da lareira,
Se alguém o pisava,
Virava as unhas e arranhava...
Ou então,
Se eu lhe mostrava o sapato,
E lhe dizia: sape gato, seu mandrião,
Ele corria para a gateira,
E ia para o palheiro,
A murar ratos, o dia inteiro.
Se alguém o pisava,
Virava as unhas e arranhava...
Ou então,
Se eu lhe mostrava o sapato,
E lhe dizia: sape gato, seu mandrião,
Ele corria para a gateira,
E ia para o palheiro,
A murar ratos, o dia inteiro.
Mas,
valha a verdade,
Despesa também não dava.
Comer, só os ratos que caçava...
E ir ao veterinário?
Bom, como assim,
Se não havia médico para mim!...
Despesa também não dava.
Comer, só os ratos que caçava...
E ir ao veterinário?
Bom, como assim,
Se não havia médico para mim!...
Já o meu
cão, esse era outra loiça!
Era um perdigueiro, de dois narizes,
E íamos os dois à caça das perdizes...
E se por descuido eu o pisava,
Ele queixava-se com a dor,
E triste olhava para mim, e assim ficava...
Era um perdigueiro, de dois narizes,
E íamos os dois à caça das perdizes...
E se por descuido eu o pisava,
Ele queixava-se com a dor,
E triste olhava para mim, e assim ficava...
Até que eu, com carinho e amor,
Lhe fazia uma festa na cabeça,
E ele abanava o rabo de contente,
Ainda por cima,
E continuava a nossa estima...
Fomos,
muitas vezes, cúmplices,
Quando íamos no encalço das perdizes.
Ele, com o vento nos narizes,
Sabia melhor do que eu onde elas estavam...
E disso, dava-me sinal:
Cabeça prá frente, bem esticada,
Pata no ar, levantada,
Nem tossia nem mugia,
Ficava tal e qual,
Até que eu lhe dizia:
Vai lá, Nero...
Então ele dava a esticada,
A perdiz levantava,
E, algumas vezes, caía...
Quando íamos no encalço das perdizes.
Ele, com o vento nos narizes,
Sabia melhor do que eu onde elas estavam...
E disso, dava-me sinal:
Cabeça prá frente, bem esticada,
Pata no ar, levantada,
Nem tossia nem mugia,
Ficava tal e qual,
Até que eu lhe dizia:
Vai lá, Nero...
Então ele dava a esticada,
A perdiz levantava,
E, algumas vezes, caía...
E quando
a perdiz caía,
Como ma entregava contente!
Então eu recebia-a,
Cuspia-lhe no nariz,
Fazia-lhe festas na cabeça,
E ele abanava o rabo, e agradecia...
Como ma entregava contente!
Então eu recebia-a,
Cuspia-lhe no nariz,
Fazia-lhe festas na cabeça,
E ele abanava o rabo, e agradecia...
Finou-se
com a idade, o meu Nero.
E no dia que ele morreu,
Primeiro chorou ele, e depois chorei eu.
E no dia que ele morreu,
Primeiro chorou ele, e depois chorei eu.
Disponível na Traga-Mundos – livros e vinhos, coisas e loisas do
Douro em Vila Real... | Traga-Mundos – lhibros i binos, cousas i
lhoisas de l Douro an Bila Rial...
[disponível também do autor:
“Passagens e Afectos” , “Histórias Maravilhosas da Terra Quente”, “Outras
Histórias de Gente d’Além Marão” e “”A Terra de Duas Línguas – II – Antologia
de Autores Transmontanos”]
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