quarta-feira, 28 de agosto de 2019

a vida antes da Traga-Mundos


Retrato António Alberto Alves

A vida antes da Traga Mundos

António Alves, nascido em Loureço Marques (atual Maputo) [Moçambique], é conhecido como o proprietário da livraria Traga Mundos e como alguém que gosta de partilhar as suas paixões. De entre elas destaca-se o voluntariado durante cinco anos na Guiné-Bissau. Tudo começou quando o livreiro decidiu ir fazer o seu doutoramento para a Alemanha. Uma vez lá, após não ter obtido uma bolsa, abriu uma pequena loja em que, entre outras coisas, promovia o voluntariado por ser uma área de que, até na atualidade, gosta e da qual tem uma definição própria. “O voluntariado, para mim, não é trabalhar de forma gratuita, é um projeto que permite ajudar as pessoas a perceberem se encontraram a área certa na sua carreira profissional”, explicou.

Informou-se relativamente a essa “área mágica”, como lhe chama, e aí descobriu uma das suas vertentes: a cooperação, um mecanismo voluntário através do qual os voluntários são incluídos num quadro estruturado para utilizar os seus conhecimentos com o objetivo de a criar e aplicar projetos que correspondam às necessidades das organizações parceiras.

António Alves candidatou-se e, uns tempos depois, foi para Guiné Bissau onde, segundo ele, viveu uma experiência que lhe mostrou a vida sob outro ângulo.

Tendo-se fixado no norte, sem eletricidade, implementou um, projeto de gestão e administração escolar, nas escolas públicas de iniciativa comunitária, que visava a criação de um regulamento interno.

Mais tarde, no âmbito da promoção da língua portuguesa, criou um programa na rádio comunitária “Uler a baand” (A hora chega) em conjunto com um amigo [guineense] professor de português. “Havia uma rádio comunitária de que eu gostava muito. Eu costumava ir lá para carregar o telemóvel, porque um dos únicos sítios em que havia eletricidade, e, no âmbito da promoção da língua portuguesa, surgiu a ideia de criar um programa de rádio”, contou, acrescentando que “lá a rádio comunitária tinha uma função enorme porque, como não há eletricidade, as rádios são a coisa mais ouvida. São criadas ‘bancadas’ onde as quotas servem para pagar o rádio e a pilha”.

O projeto piloto avançou com uma programação preparada para meia hora em horário nobre, pois os dois locutores só podiam lançar o programa à noite, uma vez que, devido aos equipamentos reduzidos, teria de ser feito em direto. “Ao outro dia, após uma reunião, fui ao encontro do Marcolino [Elias Vasconcelos] e, quanto passeava pela avenida principal, ia-me cruzando com pessoas que me iam dizendo que me tinham ouvido e que o programa tinha sido fantástico”, explicou António Alves, mencionando que o feedback foi tão bom que o projeto seguiu, acabando por formar pessoas para continuar a lançar o programa no ar sem a sua presença.

Uma particularidade deste programa é o nome: “Andorinha” que surgiu a partir de uma história que o voluntário contara na sua bancada. “Na minha bancada, havia um alpendre e lá havia andorinhas. Então, com saudade, comentei que elas vinham de Portugal. Facto que surpreendeu os guineenses, uma vez que a sua aspiração é emigrar”, disse. Mais tarde, aquando da escolha do nome do programa, para o qual havia propostas medonhas como “Lusíadas” ou “Lusofonia”, esta história voltou à superfície, o que deixou António Alves muito satisfeito.

O nome, tal como o sucesso do programa, espalhou-se, sendo adotado por várias bancadas que queriam participar no programa através do telefone. Uma participação tal que já não havia espaço no programa para todos.

Esta experiência ficou marcada em António Alves que defende ter ido “para um paraíso sem igual”. “A maneira de ser das pessoas e a cultura de partilha, fazem com que os voluntários ganhem mais do que aquilo que dão”, adiantou, confessando que, “se quiser ser feliz” já sabe para onde vai.

Cláudia Richard, “Notícias de Vila Real” n.º 676, 21 de Agosto de 2019


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